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A HORA E A VEZ DE AUGUSTO MATRAGA", DE GUIMARÃES ROSA

João Guimarães Rosa (1908-1967)



O senhor... Mire veja : o mais importante e bonito, do mundo, é isto: que as pessoas não estão sempre iguais, ainda não foram terminadas - ma que elas vão sempre mudando. Afinam ou desafinam. Verdade maior: É o que a vida me ensinou. Isso que me alegra, montão.

João Guimarães Rosa é natural de Condisburgo, Minas Gerais. Estudou as primeiras letras com o mestre Candinho, e francês, com o religioso Frei Esteves. Era um aluno tão brilhante que aos seis anos já lera seu primeiro livro nessa língua. Mudou-se para Belo Horizonte, passando a estudar no colégio Arnaldo. Lá, era frequentemente assíduo da biblioteca , colecionava insetos e borboletas, e estudava por conta própria línguas e História Natural.

Formou-se em Medicina em 1930, clinicando durante dois anos e Itaguara, Minas Gerais, onde logo ganhou fama de médico excelente e consciencioso. De volta a Belo Horizonte trabalha como médico voluntário da Força Pública durante a Revolução de 32, sendo efetivado por concurso dois anos depois.

Como era poliglota foi incentivado por um amigo a prestar concurso no Itamaraty para seguir carreira diplomática. Passou em segundo lugar e, em 1938, foi nomeado cônsul em Hamburgo, na Alemanha. Quatro anos depois, o Brasil rompeu relações diplomáticas com esse país, e Guimarães Rosa e outros funcionários do corpo diplomático ficaram reféns em Baden-Baden, tendo sido libertados em troca de diplomatas alemães detidos em solo brasileiro. Como diplomata exerceu atividades ainda na Colômbia, França e no Rio de Janeiro. Em 1952, fez uma viagem de nove dias a cavalo pelo sertão de Minas Gerais, participando de um grupo que conduzia uma boiada. Essa experiência marcaria demais sua obra. A partir do ano seguinte fixou-se definitivamente no Brasil.

Em 1963, foi eleito para ocupar a cadeira n° 2 da Academia Brasileira de Letras, mas, intuindo sua morte ao tomar posse, adiou-a por quatro anos. Morreu em 16 de novembro de 1967, exatamente três dias de sua posse.
Sagarana, foi publicado em 1946. A obra chamou atenção pela linguagem inovadora, pela singular estrutura narrativa e pela riqueza de simbologia dos contos, que o escritor havia começado a escrever dez anos antes. As histórias se passam em fazendas mineiras, tendo como personagens vaqueiros e criadores de gado.

EPOPÉIA EM MINAS GERAIS




O escritor fez, em maio de 1952, um percurso de 240 quilômetros no sertão mineiro, durante dez dias, conduzindo uma boiada. Na viagem, anotou expressões, casos, histórias, procurando apreender de forma mais profunda aquele universo com o qual tinha contato desde a infância. Seu intuito era recriar literariamente o sertão, dando voz a seus personagens.

Em janeiro de 1956 lançou Corpo de Baile, reunião de novelas que posteriormente passaram a ser publicadas em três volumes: Manuelzão e Miguilim, No Urubuquaquá, no Pinhém e Noites do Sertão.

Seu único romance, Grande Sertão: Veredas, foi publicado em maio do mesmo ano. O livro é uma rica epopéia ambientada no interior de Minas Gerais, transpondo para o Brasil o mito da luta entre o homem e o diabo. Com linguagem inventiva, explora um vocabulário complexo e inusitado. Há desde a recuperação de termos arcaicos e expressões regionais até a criação de novas palavras, para o que o autor se apoiou em seus amplos conhecimentos lingüísticos (veja abaixo).

O impacto de Grande Sertão: Veredas na cena literária foi muito grande. Desde o início, percebeu-se que se tratava de um dos mais importantes textos da literatura brasileira, o que garantiu ao autor enorme reconhecimento em todo o país. Apesar da complexidade, o livro viria a ser traduzido para diversas línguas.

Em 1961, Guimarães Rosa recebeu da Academia Brasileira de Letras o Prêmio Machado de Assis pelo conjunto de sua obra. No ano seguinte, lançou Primeiras Estórias, com 21 contos pequenos.

Candidatou-se à Academia Brasileira de Letras, pela segunda vez, em 1963 e foi eleito por unanimidade. Mas não foi empossado imediatamente, porque adiou a cerimônia enquanto pôde. Dizia ter medo de morrer no dia do evento. Só tomou posse em 16 de novembro de 1967. Três dias depois, em 19 de novembro, morreu subitamente em seu apartamento no Rio de Janeiro, de infarto.

Na língua do povo
Os sentidos de algumas expressões do escritor mineiro:
Balalhar – explodir ou partir-se pela ação de balas.
Carregume – peso, dificuldade, gravidade.
Descriado – criado ao desamparo, desnutrido.
Fraternura – ternura de irmãos.
Grãoir – formar grãos.
Nonada – nada, coisa sem importância.
Trestriste – infeliz, forma enfática de triste


OBRAS DE GUIMARÃES ROSA

ROMANCE

Grande Sertão: Veredas (1956).

CONTOS
Sagarana (1946); Primeiras Histórias (1962); Tutaméia (Terceiras Estórias) (1967); Estas Estórias (póstuma, 1969).

NOVELAS

Corpo de Baile (dois volumes) (1956); a partir da terceira edição (1964), essa obra foi desdobrada em três volumes: Manuelzão e Miguilim; Campo Geral; No Urubuquaquá, no Pinhém; Noites no Ser tão.

DIVERSOS

Ave, Palavra (póstuma, 1970).

A HORA E A VEZ DE AUGUSTO MATRAGA




A hora e a vez Augusto Matraga é o nono e último conto de Sagarana, publicado em 1946, marcou a estréia de Guimarães Rosa em nossa literatura e expressa a força e o espírito do sertão de Minas Gerais. Ao contar a história da queda de um homem poderoso em busca de sua redenção: “P’ra o céu, eu vou, nem que seja a porrete!...”.

Esse conto é considerado por muitos críticos, a mais importante produção do escritor em Sagarana, tanto por sua estrutura narrativa, quanto pelo tratamento da luta maniqueísta, e todo o questionamento decorrente de uma tomada de consciência do homem optando por uma dessa forças. É uma mistura de redenção e espiritualidade.

O conto tem início em uma festa de leilão no arraial da virgem Nossa Senhora das Dores do córrego do Murici. É final de festa, e as pessoas de bem que se encontravam nesse leilão foram todos embora, ficando somente os farreadores, e Nhô Augusto estava entre eles.

Ficara apenas duas mulheres, as prostitutas Angélica (negra) e Siriena (branca), os homens aproveitaram a presença do leiloeiro para começarem a algarrazarra leiloando-as.

Nhô Augusto ofereceu por Siriema cinqüenta mil-réis, consegue a prostituta, leva-a para casa, porém no meio do caminho, em um lugar bem iluminado enxerga melhor a mulher, achou-a muito magra “[...] Você tem perna de Manuel – Fonseca, uma fina e outra seca!” ,e manda a mulher embora.

Agora, segue seu caminho e encontra com Quim que trazia um recado de Dona Dionorá, sua esposa, pedindo que ele voltasse para casa. Mas Nhô Augusto ignora o pedido da esposa. Ela fica muito magoada com a falta de consideração, ausência, desprezo, falta de atenção do esposo e resolve partir com a filha, Minita, de 10 anos, em companhia de seu Ovídio Moura.

Nhô Augusto era um homem duro, doido, sem detença, como um bicho grande do mato. E, em casa, sempre fechado em si. Nem com a filha se importava. Da esposa gostava, às vezes: da sua boca, das suas carnes. Adorava farras, mulheres, bebidas, enfim, com os prazeres do mundo.

Quando nosso personagem ficou sabendo da notícia (sua esposa partiu) resolve partir atrás da esposa, entretanto, não obteve apoio de seus capangas, pois ele devia di8nheiro para todos, mesmo assim ele decidiu matar Ovídio, mas antes iria vingar-se de seus capangas e do major Consilva. Então foi à chácara do major e foi recebido à pancada, depois da surra o arrastaram até o rancho do Barranco. Antes de matá-lo, esquentaram o ferro do gado e marcaram sua pele com as iniciais do major Consilva, com a dor, Nhô Augusto levanta gritando e se joga do barranco. Diante disso, os capangas pensaram que ele havia morrido, coloca uma cruz no lugar e vão embora.

Um homem negro (Serapião) que por ali passava, encontra-o e leva-o para seu casebre. A tristeza tomou conta de nosso herói nesse período de recuperação. Certo dia, então disse: “Se eu pudesse ao menos ter absolvição dos meus pecados!...”.

Os negros trouxeram um padre para que ele pedisse perdão por seus pecados e após ouvir do padre que sua hora e sua vez iam chegar, considerou sua vida já acabada e esperava apenas a salvação da sua alma.

A partir desse dia ele começou a trabalhar muito e ajudar ao próximo, pois esperava a salvação da sua alma e a misericórdia divina. Dessa forma, fazia o bem sem escolher a quem, para ganhar o reino do céu.

Nessa vida de abstinência, passaram-se quase seis anos, que não fumava, bebia, não olhava para mulheres, nem discutia.

Nhô Augusto mudou totalmente seu comportamento após a surra que quase o levou à morte , a partir daí resolveu ser uma pessoa do bem. Aqui, nesse momento da narrativa, a personagem passou por uma transformação, obteve uma revelação, é a epifania.

Um dia, passou pela região Tião de Thereza, um velho conhecido de Nhô Augusto, dando notícia de sua família: Dona Dionóra continuava amigada com seu Ovídio e sua filha caíra na vida com um homem desconhecido. O Quim Recadeiro havia morrido de morte – matada, com mais de vinte balas no corpo, por causa dele, Nhô Augusto, quanto tentou vingar-se dos capangas que pensava terem o matado.

Diante desse fato, sentiu-se culpado e fez muitas orações, caridades, para não perder seu lugar no céu.

O tempo foi passando, e Nhô Augusto começou a sentir fome, sono, vontade de fumar e falta de mulher. Na verdade, ele pensou que Deus o havia perdoado e com todas essas vontades não se sentiu pecando por isso.

E, é justo nesse momento, que Nhô Augusto considera-se perdoado por Deus, que certo dia aconteceu um fato até hoje lembrado pelo povinho do Tombador, pois chegou ao lugarejo um bando de homens valentões. Nosso personagem foi até o chefe, Joãozinho Bem-Bem, e ofereceu sua casa para que ele ficasse bem hospedado.

Todos conversaram muito bem, durante à noite, e o líder do bando, na hora de ir embora, convidou nosso herói para ir com eles, mas o convite foi recusado. Apesar disso, os invejou “[...] Aqueles, sim, que estavam no bom, porque não tinham de pensar em coisa nenhuma de salvação de alma.” Pensou bem e considerou que essa história de andar pra trás e, por isso, decidiu retornar aos seus antigos caminhos.

Voltou a beber e a sentir saudades das mulheres. Alguns dias depois, despediu-se e foi embora em um jumento emprestado, animal sagrado, misturado às passagens da vida de Jesus.

Então, ele foi ao encontro do bando de Joãozinho Bem-Bem, mas sem a menor idéia de onde encontrá-lo, diante disso, deixou que o jegue o levasse, e entraram em um arraial, denominado Rala – coco, por coincidência, estava a jagunçada de Joãozinho Bem-Bem. Nhô Augusto foi recebido pelo grupo com muita satisfação.

Mas, infelizmente, quando nosso protagonista chega ao arraial está acontecendo uma confusão, na qual Joãozinho Bem-Bem ia matar um homem para vingar a morte do Juruminho, seu colega de bando. Porém, como o culpado havia fugido, “A família vai pagar, direito!”.

Diante disso, chegou o velhote, pai do traidor, ou melhor, pai do matador de Juruminho, este chegou implorando por misericórdia, entretanto, Joãozinho Bem-Bem não queria desculpas “[...] Um dos dois rapazinhos seu filhos têm de morrer, de tiro ou à faca, e o senhor pode é escolher qual deles é que deve de pagar pelo crime do irmão. E as moças... Para mim não quero nenhuma, que mulher não me enfraquece: as mocinhas são para os meus homens...”.

Dessa forma, nosso personagem principal interveio, alegando um pedido em nome de Nosso Senhor e da Virgem, esse pedido tinha que ser respeitado. Então, Joãozinho sentiu-se preso a Nhô Augusto por respeito e não soube o que fazer. Seu bando, no entanto, liderado por Teófilo Sussuara, que era um homem bronco, excessivamente bronco, caminhou para cima de Nhô Augusto, e Joãozinho Bem-Bem também entrou na briga.

O povo encheu a rua, a distância, para ver a briga de Joãozinho Bem-Bem mais o homem do jumento. Por fim, nosso herói cortou a barriga do chefe do bando, condenando-o à morte. Preocupado com a salvação de Joãozinho Bem-Bem, Nhô Augusto pediu que ele se arrependesse de seus pecados, entretanto, não ouviu resposta, pois este morreu e4m seguida.

Nhô Augusto estava muito machucado e pediu para chamar um padre “[...] Pede para ele vir me abençoando pelo caminho, que senão é capaz de não me achar mais ...”.

O povo de Rala-coco dizia: “Foi Deus quem mandou esse home no jumento, por mor de saber as famílias da gente...” E o velho dizia: “Não deixem este santo morrer assim...”.

No final, Nhô Augusto pergunta se no meio daquela multidão alguém ouviu falar de Nhô Augusto Estêves, das Pindaíbas!

Neste momento, apareceu João Lomba, conhecido velho e meio parente, o qual obteve um pedido de Augussto Matraga, que colocasse a bênção em sua filha e que dissesse a Diónora que está tudo em ordem. Depois disso, morreu.

Nota-se que nesse final, o personagem é chamado de Augusto Matraga, e, assim, faz uma relação com o início do conto: “Matraga não é Matraga, não é nada. Matraga é Esteves. Augusto Esteves”, pois no início do conto a personagem principal é designada como Augusto Esteves, que mora em Murici, onde é um espaço físico e, também, existencial da personagem, aqui, ele é um homem mandão, autoritário, que vive uma vida de farras, mulheres, capangas, bebidas, não se importa nem com a família. Esse nome possui uma relação social, impõe respeito, poder, e, além disso, ele é filho do coronel Afonsão Esteves, o qual possui dinheiro, porém com a morte deste, Augusto Esteve começa a esbanjar o dinheiro do pai e acaba perdendo tudo, até seus capangas por falta de pagamento.

Após alguns conflitos com seus capangas, Major Consilva, abandono da esposa, surra que levou é nomeado por Nhô Augusto, um período de penitência, sacrifícios, tudo que faz é trabalhar, trabalhar o tempo todo e ajudar o próximo, assim, conseguiria o perdão divino referente aos pecados do passado. Fazia o bem sem escolher a quem, porque seu objetivo era ir ao céu.

Nesse período que a personagem renasceu para uma nova vida, fazer o bem, ele faz reflexões de sua vida, uma busca existencial, é uma travessia existencial, isto é, era um homem mal e, agora, é do bem, e a todo o momento do enredo há esse questionamento maniqueísta.

Nesse tempo de sacrifícios dos prazeres do mundo, aparece um bando de jagunços e traz o encontro de Nhô Augusto com Joãozinho Bem-Bem, os quais são responsáveis pelo final do conto, pois no final da história acontece uma discussão, briga, isso é motivo da morte gloriosa e salvadora do protagonista Augusto Matraga.

Voltando ao momento em que os Jagunços de Bem-Bem chegaram em Tombador, aqui a personagem sente vontade de mudar de vida, ir para o caminho do mundo, achava que Deus já o havia perdoado, portanto, não precisava continuar com todos aqueles sacrifícios.

O espaço Tombador não é apenas um espaço físico, mas também, está relacionado com a existência da personagem, seu momento de travessia existencial. No final do conto “Augusto Matraga, Matraga não é Matraga, não é nada”, logo ,volta ao início da narrativa. Nesse instante, a personagem é nomeada como Augusto Matraga e encontra-se no arraial de Rala-coco.

Quando ele está nos últimos momentos de sua vida, revela-se como Augusto Esteves, da Pindaíba, e preocupa-se com a família, dando a bênção para sua filha e perdoa Diónora, ambas com moradia desconhecida para Augusto Matraga, e após esse pedido morre.

Vale mencionar que existe uma relação entre essa história e a bíblia. Augusto Matraga morreu para ajudar uma pessoa, ou melhor, salvar uma vida, assim como Jesus, que morreu para nos dar a vida eterna.

O intuito da personagem era alcançar o reino do céu, mesmo utilizando da violência. A sua história é uma travessia em busca da absolvição de seus pecados do passado, ou seja, gira em torno desse conflito entre o bem e o mal.

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